terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

A menina e a bica

“Menina, sai daí”. O velho, cansado, doente e sem voz firme que fizesse a boneca parar, diminui, encolheu, murchou. A derrota era quase irmã de ombro nessa hora. Queria fazê-la entender a razão. A bica d’água não funciona mais. É só um fio que não mata a sede, que não lava o rosto. Não molha a mão nem com paciência. Fica lá, teimoso a fazer da areia barro, da espera uma aposta sem retorno.

Falta perna pra alcançar o som que insiste. Não parece rio, não parece mar, é só fluxo minguado. “Chega não, tem nada”. O velho então se cala. Tem preguiça de falar, o corpo é arrastado. Vê as pontas dos pés da menina como de bailarina. Ela dança, rodopia na tarde. Fecha os olhos e mostra a língua, não chega. Aterrissa, abre os olhos. Estende a mão e toca água. Vitória. Mas o que faz com os outros dedos – polegar, anelar e mínimo? Eles continuam quentes, secos, esticados.